Contos de FÁ...bulas
Dois rapazes, vizinhos e amigos desde sempre, cresceram como
irmãos. Dividiam as dores, os sorrisos...menos as garotas, isso era de lei.
Dividiam até a conta do chopinho de sexta porque papear com o melhor amigo é o
que existe de mais relaxante.
Padrinhos de casamento um do outro, padrinhos dos filhos um
do outro resolveram morar no mesmo prédio. Vizinhos de porta.
Pela manhã, saiam correndo para o trabalho e falavam do jogo,
xingavam o time, falavam dos filhos, das esposas, do trabalho, menos de política, pois nessa questão eram
tão diferentes que as ideias de um nunca
conversavam com as do outro, mas isso nunca foi problema e seguiam
amigos como sempre.
Um dia, a coisa começou a ficar quente em Moscápolis, país onde moravam.
Dois grandes partidos iam entrar em campo para defender suas
propostas e determinar o futuro daquele país pelos próximos quatro anos. A disputa
estava muito tensa e os defensores de um ou de outro se degladiavam em praça
pública dando golpes com aviõezinhos de papéis e tacando malas uns nos outros.
Os dois amigos estavam muito eufóricos com todo esse alvoroço
e escolheram logo os seus candidatos: um passou a defender Toninho Mamata e o
outro a defender Tião Cuecão. Defenderam tanto que se esqueceram um do outro.
Se esqueceram tanto que se ofenderam. Se ofenderam tanto que nunca mais se
falaram. Suas esposas e filhos terminantemente proibidos de falar com o vizinho
e agora inimigo.
Nos corredores do prédio já não se falavam e evitavam o
elevador descendo em horários diferentes ou pela escada caso se esbarrassem.
Tião Cuecão venceu a disputa e o amigo que defendia esse candidato
passou a desfilar sorridente e de peito estufado pelos corredores fazendo
questão de deixar claro para o vizinho que havia vencido tão importante
disputa.
Depois de um ano de governo descobriu-se várias coisas sobre Tião Cuecão e os funcionários públicos de Moscápolis, com
o salário espremido pela inflação, como o nosso querido personagem defensor
desse político, pediram a renúncia de Tião cuecão.
Toninho Mamata aproveitou a situação e com um golpe de
mestre assumiu o poder se tornando presidente de Moscápolis.
O vizinho defensor de Toninho Mamata foi quem dessa vez não
se conteve e pegou a velha cornetinha
dos campeonatos de futebol passados e fez um alarido por toda a vizinhança
principalmente perto da porta do ex amigo de infância.
Passou-se mais um ano em Moscápolis sem que os dois amigos
voltassem a se falar. A situação daquele país continuava caótica, pois os
combustíveis haviam aumentado e agora a luz também havia disparado. Nosso amigo
da cornetinha tinha vendido ela há alguns meses pra pagar uma conta de luz
atrasada e passou a ir e voltar do trabalho de bicicleta para economizar
dinheiro.
E em uma dessas manhãs qualquer em que se tem que fazer o
mesmo de todos os dias os dois vizinhos saíram para trabalhar e ao sair se
encontraram, se olharam, fizeram um aceno com a cabeça, esperaram calados o
elevador e calados entraram nele quando chegou no andar em que estavam. E, quando foram apertar a o botão para o
térreo, a luz do prédio acabou.
Muito boa essa crônica.
ResponderExcluirArthur Claro
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